Por David Sloan Wilson e Robert Frank
Tradução de Graciela Kunrath Lima
Revisão
O economista Robert Frank, da Universidade de Cornell, é altamente respeitado dentro de sua profissão e bem conhecido do público em geral através de seus livros como The Winner Take All Society [O vencedor toma toda a sociedade] e Luxury Fever [Febre de Luxúria]. Em seu último livro, The Darwin Economy [A Economia de Darwin], ele prevê que daqui a cem anos, Charles Darwin, e não Adam Smith, será considerado como o pai da economia. Eu entrevistei Bob em seu escritório em 20 de Agosto de 2015. Comecei pedindo-lhe para explicar a sua previsão, e acabamos por discutir como encurtar cem anos para dez anos.
DSW [David Sloan Wilson]: Bob Frank, bem-vindo ao Evonomics.
RF [Robert Frank]: Bom estar com você novamente!
DSW: O senhor disse que em cem anos, Charles Darwin e não Adam Smith, será considerado o pai da economia. Pode explicar o que quer dizer com isso?
RF: Bem, isso foi apenas uma tática de marketing barato. Era uma afirmação que eu sabia que não teria vergonha de ter feito se ela estivesse errada, porque daqui a 100 anos ninguém vai se lembrar de nada sobre isso. Mas, foi uma afirmação que pensei que eu poderia defender se eu precisasse fazê-lo. Você conhece a famosa associação no imaginário público, entre Adam Smith e o teorema da mão invisível; a noção de que se você largar pessoas egoístas a solta no mercado e deixá-las procurar os seus próprios interesses restritos, você terá bons resultados para a sociedade como um todo. A visão de Smith apontava um pouco menos para este assunto do que a visão de seus discípulos modernos a respeito do que ele disse. Eles parecem pensar que ele acreditava que sempre seriam obtidos bons resultados. Ele era muito mais circunspecto. Ele achava interessante que muitas vezes você obtinha bons resultados quando as pessoas seguiam seus próprios interesses. Acho que foi Darwin que viu muito mais claramente a relação geral entre a busca da vantagem individual e o bem-estar dos grupos. Em sua teoria da seleção natural, a ênfase é sobre a forma como uma característica ou comportamento ajuda o indivíduo.Se a característica promove a sobrevivência e a reprodução do indivíduo que a possui, então, geralmente, ela será selecionada para isso. Muitas vezes, essas características também são boas para o grupo, mas não necessariamente. Uma visão tão aguçada no falcão – ótimo para o animal individual, ótimo para falcões em geral.
Outros traços, especialmente aqueles envolvidos em “corridas armamentistas” para a seleção sexual, são geralmente prejudiciais, pelo menos para os grupos, se não para toda a espécie. Um dos exemplos vivos é o tamanho descomunal das galhadas (chifres) de certo tipo de cervo/veado (Cervus canadensis: uapiti – bull elk). Elas medem mais de um metro, pesam quase 20 quilos: são um estorvo horrível. Se um cervídeo desses é perseguido dentro da floresta por lobos, ele é facilmente cercado e morto. Ele não consegue manobrar. Mas esses chifres são indispensáveis, pois cervos são uma espécie poligâmica, como a maioria dos vertebrados. Eles lutam uns com os outros para o acesso às fêmeas, e muitos deles não conseguem parceiros sexuais de forma alguma, sendo esta a posição do grande perdedor no esquema Darwiniano. Então, ter chifres maiores do que seus rivais passa a ser uma enorme vantagem. Essa corrida amarmentista não pode durar para sempre. Vemos chifres de um metro, e não chifres de dez metros. Eles pesam vinte, e não duzentos quilos. É verdade que a seleção natural impõe limites sobre as corridas armamentistas, mas o ponto importante é que não existe presunção alguma de que eles são os melhores do ponto de vista dos cervos envolvidos. Se eles pudessem cada um cortar seus chifres pela metade, isso seria convincentemente um bom negócio para eles. Todas as lutas seriam decididas como antes, e todos os cervos seriam menos vulneráveis aos predadores.
Quando olhamos para o mercado, existem muitas situações que são exatamente análogas à corrida armamentista que levou a grandes chifres nos cervídeos. Eu penso que com o tempo viremos a reconhecer – aqueles que ainda não o fizeram – que não deveria haver qualquer presunção de que a competição leva, em geral, a bons resultados para o grupo.
DSW: Deixe-me generalizar isso. Você deu um exemplo de seleção sexual, e sei do seu livro “The Darwin Economy” que existem muitos equivalentes humanos para isso – várias formas de corridas armamentistas. Mas outra coisa que Darwin descobriu, eu acho que um pouco para seu próprio espanto, é que se você olhar para todos os traços associados com a moral – o que fazemos para beneficiar o nosso grupo – eles normalmente não são seletivamente vantajosos dentro dos grupos. Portanto, não é apenas uma questão de se esforçar por seus companheiros ou se esforçar para ser o melhor de todos. A respeito de qualquer comportamento que seja para o bem do grupo, ele vai custar tempo, energia e risco para o indivíduo, o que coloca este cidadão em sólida desvantagem seletiva dentro dos grupos. Portanto, o problema é ainda pior do que você diz, quando você aponta para o exemplo dos cervídeos.
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RF: Sim. Penso que Smith e seus discípulos modernos, todos reconhecem bem o suficiente que muitas pessoas enganam, mentem e roubam quando pensam que podem se safar, e isso não é bom para o sistema como um todo. Eu percebo minha contribuição como apontar que existe todo um conjunto de comportamentos voluntários, legais, de livre adoção, que têm más consequências para os grupos, embora os indivíduos não tenham nenhuma razão para ter dúvidas ao aderirem a estes comportamentos.
DSW: Certo.
RF: Os empresários que construíram grandes placas ao longo da Rota 13 ao sul de Ithaca não criaram este corredor incrivelmente feio porque eles tinham mau gosto. Para uma placa ser eficaz, eles sabiam que ela necessitava se destacar em relação às outras placas nas proximidades. Isso significa que ela deve ser mais alta, estar em local de destaque, ter luzes brilhantes. Dado que é a visibilidade relativa da placa que conta, é claro que você terá uma explosão de placas horríveis. A única maneira de evitar isso é criar regulamentos que limitem o tamanho, forma e composição das placas, o que muitas comunidades, obviamente, fazem.
DSW: No coração disto está a palavra relativo(a). Quando eu resumo o que a Economia de Darwin significa, comparada ao pensamento econômico padrão, é a aptidão relativa x aptidão absoluta. Na evolução, evolui aquilo que faz algo melhor do que qualquer outra coisa. A evolução é sempre relativa e pode ser em relação a um número de escalas; dentro dos grupos, entre os grupos, e assim por diante. Mas a teoria econômica, especialmente a teoria econômica formal, parece basear-se num conceito de utilidade absoluta. Primeiro deixe-me verificar com você se eu estou correto, e depois deixe-me perguntar por que a economia desenvolveu-se dessa forma e nunca percebeu nada de errado com ela mesma. Por que teve que aparecer alguém como você para salientar que tantos processos sociais baseiam-se em vantagem relativa, e não utilidade absoluta?
RF: Primeiro de tudo, você está correto dizer que o aparato teórico formal da economia hoje ignora completamente a relação entre contexto e avaliação. É o meu carro, OK? É meu terno, OK? É a minha casa, OK? Segundo a teoria econômica padrão, as respostas a essas perguntas todas dependem apenas das qualidades absolutas das coisas envolvidas. Será muito estranho em cem anos a partir de agora, eu acho, quando economistas e outras pessoas olharem para trás sobre o estado do discurso em economia em nossos tempos. “Por que não estavam levando o contexto em consideração?” será a primeira pergunta que as pessoas vão fazer. Eu penso sobre essa questão há décadas. Eu tenho alguns pensamentos preliminares sobre isso, mas eu ainda tenho a sensação de que eu não sei bem qual é a resposta. Mas sobre a questão “O contexto importa?” Eu acho que mesmo os economistas, se você os pressionasse, não afirmariam que isso não acontece. Então você quer aparentar bem quando você vai para sua entrevista. O que isso significa? Olhando bem, é um conceito essencialmente relativo. Isso significa parecer melhor do que outras pessoas que querem o mesmo trabalho que você deseja no banco de investimentos. Se os outros candidatos estão vestindo ternos de quinhentos dólares e você for vestindo um terno de dois mil dólares feito sob medida, você ainda não conseguirá o emprego se tiver notas ruins e não falar bem, mas se todo o resto é igual – e sabemos disso a partir de experimentos – é mais provável que você consiga um retorno do que as pessoas vestindo os ternos baratos. O entrevistador pode não ser capaz de dizer de que cor era seu terno, ou qualquer coisa desse tipo. Tudo opera fora da percepção consciente, mas ter boa aparência significa parecer relativamente bom, e as pessoas têm uma consciência sutil de quem parece ser bom. Não há percepção absoluta de que podemos definir um padrão para um terno ser considerado bom. A percepção é sempre relativa.
Eu morava em uma casa de dois quartos, sem saneamento ou eletricidade, quando eu era um voluntário do Corpo de Paz no Nepal. Não era apenas OK, mas uma excelente casa, uma das melhores casas que qualquer um dos professores na escola onde lecionei viviam. Eu tinha orgulho de convidar pessoas. Mas não seria uma casa OK em Ithaca. Seria uma casa que escancara para a comunidade que ali está uma pessoa que não fez o que foi minimamente esperado dela.
DSW: Isto me faz lembrar de algo. Eu sei um pouco sobre sua história pessoal. Sua história pessoal é incomum para um economista – é possível dizer isso?
RF: Eu não acho que é tão incomum. Há muitos economistas que passaram no Corpo de Paz, além de mim.
DSW: OK, eu me corrijo.
RF: Mas, eu diria que 99,5% dos economistas não participaram do Corpo de Paz. Isso seria verdade para 99,4% dos outros americanos. Não é uma diferença enorme.
DSW: Existe um filtro, eu acho, para quem se torna um economista e, em seguida, há um outro filtro para quem tem sucesso depois que começam seu treinamento. Você trabalhou nisso. O treinamento em Economia é uma experiência formativa que molda a maneira como você pensa.
RF: Tom Gilovich, Dennis Regan e eu fizemos alguns experimentos há muito tempo em que tentamos determinar se estudar economia faz as pessoas se comportarem de uma forma mais auto-interessada (egoísta). Seria estranho se não houvesse esse efeito, porque os modelos que usamos em economia supõem que as pessoas são auto-interessadas, no sentido estrito do termo.Então, se você faz experimentos com os dilemas do prisioneiro, um jogo muito popular para explorar a interação entre o interesse da comunidade e o auto-interesse, a previsão dos modelos de economia é que todo mundo vai desertar (em um jogo one-shot, de tentativa única). Nossos experimentos procuraram determinar se os alunos que estavam estudando economia eram mais propensos a desertar do que outros. A primeira coisa a notar é que muitas pessoas não desertam, ao contrário da previsão. Elas nunca verão os seus parceiros de novo; elas interagem apenas uma vez. A teoria é muito clara, de que você terá um retorno melhor se você desertar, não importando o que o outro jogador faça. No entanto, uma grande proporção de pessoas não deserta. Nesses experimentos, se você estudou economia, você era substancialmente mais propenso a desertar do que se tivesse formação em alguma outra área. Todos os participantes do experimento eram estudantes de graduação da Universidade de Cornell. Este foi um efeito de treinamento ou um efeito de seleção? (Talvez os alunos que escolheram a especialização em economia eram apenas mais egoístas, para começar.) Nós não poderíamos dizer a partir desse resultado, por isso também examinamos em qual período os estudantes estavam. Se você fosse um calouro ou estivesse no segundo ano, a diferença entre os estudantes de economia e os demais era muito menor do que em relação aos estudantes mais avançados. Quanto mais tempo você estudava economia, maior a diferença nas taxas de deserção. Essa é a constatação esperada. Se você ensina que as pessoas vão desertar no dilema do prisioneiro – sabemos de experimentos que se você disser para alguém “olha, já vimos o formulário, seu parceiro já desertou. O que você quer fazer?” – todo mundo deserta neste caso. Sob quais bases você esperaria que um economista não seria mais propenso a desertar se durante todo o dia ele ensina aos alunos que é isso que as pessoas fazem nessa situação? Então, é um caso interessante da vida imitando a arte. Nós nos tornamos o que nós ensinamos.
DSW: Sim, a teoria decide o que podemos observar. A maneira que eu gostaria de estruturar a próxima parte desta conversa é focar primeiro num nível teórico formal e depois em um nível narrativo, e observar a desconexão entre os dois. Isso é o que eu aprendi. O que a teoria econômica formal diz e o que o discurso popular diz sobre um assunto como a “mão invisível”, basicamente, eles têm vidas separadas.
RF: Sim.
DSW: Quero explorar isso. Mas no nível teórico, o meu entendimento é que a tradição Walrasiana, que é mais ou menos inspirada pela física newtoniana e as tentativas para modelar os seres humanos como uma espécie de átomo – uma “física social” – que as suposições necessárias para construir esse tipo de modelo tornam muito difícil incorporar coisas como normas e preferências, que são influenciadas por outras preferências. Assim, o aparato teórico formal torna-se inflexível para incorporar certos pressupostos, e esta é uma das razões porque é difícil fundamentar a teoria econômica em algo como a aptidão relativa. Estou correto quanto a isso?
RF: Essa é uma das possíveis explicações que também considerei quando estive pensando sobre a resistência em incorporar as preocupações relativas nas análises econômicas formais, mas eu acho que se você olhar cuidadosamente para esta hipótese, ela não se sustenta muito bem. Economistas gostam de modelos formais, isso é verdade, mas o que também é verdade é que quanto mais complicados eles são, melhor. A análise formal é uma forma de demonstrar o quanto você é inteligente. Se você é um de dois candidatos competindo por uma cerimônia de economia, a coisa mais importante que você deve saber é que vai ser de seu interesse ser o mais formalmente qualificado dos dois. Os economistas têm respondido a esse incentivo, tornando-se cada vez mais formais em suas abordagens à forma como eles escrevem sobre as decisões econômicas. Mas podemos facilmente formalizar a suposição de que as pessoas se preocupam com posição relativa. Eu me importo com o quão grande a minha casa é em termos absolutos, mas também me preocupo como ela se classifica na distribuição percentual de casas na minha área. Isso adiciona uma pitada extra de complicação ao modelo. Por que esta pitada não é atraente para um economista, assim como recursos complicadores parecem ser em outras áreas?Eu não acho que é isso.
DSW: Deixe-me retornar, pois tempos atrás quando a ciência da complexidade era novidade e James Gleik escreveu seu livro Chaos, que foi um dos melhores livros para o público em geral sobre um assunto complexo, ele demonstrou que em física e biologia há uma parede de complexidade além da qual modelos analíticos formais não conseguem ir. A única maneira de explorar esse terreno é com modelos baseados em agentes e outros métodos de simulação de computador. Na época, porque havia tanto prestígio associado com modelos analíticos formais, o que eles fizeram foi apenas definir o seu objeto de forma a deixar todas essas coisas interessantes de fora!
RF: Sim, isso é um ponto absolutamente válido.
DSW: Isso é o que os economistas estão fazendo. Portanto, não é verdade que você pode ir lá com modelos analíticos formais. Você necessita mudar sua abordagem totalmente em alguns aspectos, a fim de estudar sistemas econômicos como sistemas complexos freqüentemente fora de equilíbrio.
RF: É verdade que quando você está estudando um sistema verdadeiramente complexo, com milhares de variáveis, interações e não-linearidades, soluções padronizadas não estão disponíveis. Você não pode alcançá-las e por isso a única coisa que você pode fazer é simulações numéricas desajeitadas e modelagem baseada em agentes e afins. Isso é menos elegante e naquele tempo estava fora de moda. Aceito totalmente aquela explicação para justificar por que esses tipos de modelos eram mais lentos para progredir do que deveriam ter sido. A modificação que acabei de descrever, porém, onde você inclui um recurso adicional em um modelo: como a função utilitária parece? O agente se importa com o quão grande o seu carro ou casa é …
DSW: OK, então você pode construir um pequeno modelo local.
RF: … e, em seguida, você adiciona mais uma característica que capta a essência deste importante fenômeno que está completamente ignorado. Esse é um modelo que não só enquadra o comportamento muito melhor do que o modelo mais simples faz. Não é muito mais complexo. Certamente não está além da nossa capacidade de obter soluções de forma padronizada. Eu construí modelos assim e outras pessoas também. Claro, se você for longe o suficiente entrará em águas profundas e então não poderá obter soluções padronizadas. Outros métodos estão se tornando mais aceitáveis. Eu não acho que é isso. Penso que há apenas algo sobre a invocação de comparações interpessoais que coloca as pessoas no limite em economia. Há um economista libertário que eu citei – Donald Boudreaux – que diz algo como “É verdade que as pessoas têm certas preferências, assim como nós suspeitamos de estranhos e estrangeiros que não se parecem conosco, mas eu não gostaria de basear a política econômica em preferências desse tipo. Da mesma forma, eu não gostaria de basear a política econômica no fato de que alguém sente ciúmes quando seu vizinho tem uma casa melhor do que esse alguém.” Não é uma negação de que as pessoas têm esses sentimentos; é um reconhecimento de que eles existem, mas não são bagagem adequada para fomentar a política econômica. E isso é apenas errado. Não é sobre a inveja e o ciúme, sobre “Meu terno está legal?” Não me causa inveja o fato de outros candidatos terem ternos melhores do que o meu. É porque eu não vou obter uma ligação de retorno desta entrevista, porque eles têm ternos melhores que o meu. Se a minha casa é menos cara do que casas de pessoas como eu, meus filhos frequentarão escolas piores do que os filhos das outras pessoas. Assim, o único insight de Darwin que tinha mais poder do que qualquer outra coisa, na minha mente, era a sua percepção de que a vida é graduada na curva.
DSW. Sim. É como Monopoly (Banco Imobiliário). Se alguém faz uma jogada que dá a alguns jogadores um aumento de 10.000 em moedas do jogo e a outros dá aumento de 1000, isso não está certo, por que, assim, quem vai ganhar o jogo?
RF: Você não é melhor se você tem o aumento de 1000 moedas do jogo.
DSW: É tão simples!
RF: Há um excelente cartoon da revista New Yorker. Um cara está dizendo ao seu chefe apontando para um colega de trabalho, do outro lado do grande escritório: “Se você não pode ver claramente uma forma de me dar um aumento de salário, que tal dar ao meu colega Williams uma redução?”
DSW: [risos] Não tem um estudo feito usando Monopoly, onde deram a um jogador mais do que aos outros?
RF: Sim!
DSW: Diga-me os resultados desse estudo, pois você está mais familiarizado com ele do que eu.
RF: Este é um trabalho feito na Universidade Berkeley, no Departamento de Psicologia. Se as pessoas recebem doações adicionais de papel-moeda no jogo Monopoly, eles se comportam de uma maneira muito diferente do que as pessoas que não receberam o dinheiro. Eles se sentem com direito a privilégios fora do domínio do jogo. A mesma equipe estudou a propensão dos carros a parar para os pedestres que aguardavam para atravessar a rua. Na Califórnia, há uma norma muito rigorosa de que você deve parar quando um pedestre está prestes a entrar em uma faixa de pedestres. Os motoristas de carros de luxo foram muito menos propensos a parar para os pedestres do que os condutores de automóveis populares.
DSW: E no jogo Monopoly, os que receberam mais dinheiro, se bem me lembro – em primeiro lugar, eles atribuíram seu sucesso à sua capacidade de jogar o jogo, e em segundo lugar, fizeram ruídos maiores quando eles estavam usando suas peças. Eles faziam Shlap! Shlap! Shlap! [risos]
RF: Sim! É interessante. Nenhum de nós está imune a esses sinais sutis. Tenho notado, ocasionalmente, quando por acidente eu ganho um “upgrade” para a classe executiva em uma viagem de avião. Quando eu estou sentado na classe executiva, eu me sinto como se eu fosse uma pessoa mais importante. Eu sou a mesma pessoa que era antes desta atualização acidental acontecer, mas há definitivamente uma aura que você sente quando você está nessa posição, mesmo que você está plenamente consciente do fato de que você não tinha nada a ver com isso.
DSW: Uma das razões pelas quais a evolução precisa ser a base para a economia é que, se você observar toda a história de como nós evoluímos como espécie, é tudo sobre isso. É tudo sobre a capacidade dos membros de pequenos grupos manterem uns aos outros sob controle, de modo que o indivíduo supostamente dominante não é autorizado a intimidar e mandar em outras pessoas ao redor. Essa capacidade de manter as pessoas sob controle permite que pequenos grupos funcionem como equipes. Tudo isso tem a ver com reputação. Em pequenos grupos humanos, o indivíduo dominante torna-se dominante cultivando uma boa reputação, enquanto que em outros primatas o indivíduo dominante é apenas o maior bandido.
RF: Certo.
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DSW: É por isso que nós somos humanos.
RF: O que foi um enorme avanço também. Todo o esforço que é desperdiçado quando bandidos competem uns contra os outros é mais bem aproveitado quando temos esse outro canal para isso.
DSW: E todo o segredo para a governança em uma escala maior é a implementação em grande escala do que acontece relativamente naturalmente em pequena escala. Parece que uma receita simples para uma boa governança é a utilização de pequenos grupos como um modelo para grupos maiores.
RF: Sim, essa é uma visão realmente importante.
DSW: Você tem uma proposta prática para a Economia de Darwin, que é uma forma específica de tributação. Isso está correto? Pode resumir esta proposta e me dizer como ela está? Alguém está te ouvindo?
RF: [risos] Eu estive defendendo a minha proposta política específica por cerca de três décadas.Eu estou supondo que se estamos mais perto de adotá-la do que estávamos quando começamos, o avanço foi de apenas um fio de cabelo. Portanto, não muito progresso. Talvez faça sentido descrever o problema que ela deveria resolver antes de descrever a política em si. Uma vez que o contexto importa, nós acabamos nos envolvendo em despesas relacionadas às “corridas armamentistas”. Por exemplo, sua filha vai se casar. Todo mundo quer que os convidados vão embora do evento pensando que eles se divertiram, lembrando de uma ocasião especial. Quanto você tem para gastar com o casamento, a fim de alcançar esse objetivo? Mais uma vez, especial é um conceito relativo. Em geral, a resposta é que ele depende de quanto os outros estão gastando e do que eles estão fazendo. Normas diferem enormemente de país para país, e de acordo com os períodos históricos O que sabemos nos EUA é que o casamento médio, em 1980, custava US$11.000 em dólares de hoje. Os dados mais recentes que eu vi eram para 2014, que eram de US$31.000. Então, quase o triplo hoje para o casamento médio, em comparação com o que gastávamos em 1980. Em Manhattan, o casamento médio hoje custa US$76.000. Então, por que ele ficou tão mais caro? A única explicação convincente começa com a observação de que, desde 1980, todos os ganhos de renda foram para as pessoas que estão no topo. Elas gastaram mais em tudo, que é o que todo mundo faz quando ganha mais dinheiro. Portanto, falta-lhe perspectiva se você aponta seu dedo para as pessoas e diz que elas não deveriam gastar tanto. Elas têm um monte de dinheiro e todos ao seu redor têm um monte de dinheiro. Os padrões deles são diferentes em seus círculos e uma ocasião especial para eles deve custar 3 ou 4 milhões de dólares. Você tem que contratar uma banda de rock famosa para tocar, ou então não vai parecer que é uma ocasião especial. A classe média não está tentando fazer isso, eles não podem, mas as pessoas que estão logo abaixo dos ricos que vão para estes mesmos casamentos, o quadro de referência que define o que eles têm para gastar muda, e por isso se conecta para baixo um nível de cada vez, de modo que o casamento médio agora é de US$31.000. Alguém acha que as pessoas casadas hoje são mais felizes porque elas estão gastando três vezes mais do que os casais gastavam há 30 anos? Aposto que você encontraria muito poucas pessoas dispostas a defender essa afirmação em um debate. As pessoas que estudaram as despesas de casamento, na verdade, descobriram que quanto mais você gastar em um casamento maior a probabilidade de divórcio em qualquer intervalo de tempo depois que você se casou. Por isso, não parece fazer nada bem para casais estar gastando muito mais. Por que eles estão fazendo isso? Porque se você não gastar o que os outros gastam ou pelo menos chegar perto disso, as pessoas iriam pensar que você é um pão-duro que não preza o quão importante a ocasião é. Isso é puro desperdício. Desperdício econômico puro. Temos outras coisas importantes para fazer com aqueles dólares.
Minha proposta de política é a de acabar com o imposto de renda, e em seu lugar adotar um imposto profundamente mais progressivo sobre a despesa total de consumo familiar por ano.
Como você faz isso? Na verdade, é mais simples do que parece. Você relata o seu rendimento para a receita federal do mesmo modo que você faz atualmente. Poderíamos simplificar muito isso e deveríamos. Você também iria relatar o quanto você tinha poupado durante o ano. Nós já descobrimos como fazer isso com 401.000 contas, e outras contas de poupança de aposentadoria isentas de impostos. A diferença entre esses dois números – o seu rendimento menos as suas poupanças, é o quanto você gasta durante o ano. Esse montante, menos uma grande dedução padrão, digamos, US$30.000 para uma família de quatro pessoas, é o seu consumo tributável. Se a diferença entre seu rendimento e sua poupança é um pequeno valor, então você não paga nada. Se ele fica na faixa de US$40.000 a US$50.000, as taxas começam baixas, assim como fazem com imposto de renda, mas, aí elas aumentam gradualmente,e terminam num valor muito mais elevado do que seria sob as maiores taxas fiscais atuais. Elas teriam que ser maiores, já que você está isentando as poupanças de imposto, se você quiser arrecadar as mesmas receitas de antes. Você pode até imaginar um sistema em que o imposto sobre o próximo dólar consumido, se você já está consumindo dois milhões de dólares por ano, pode ser 100%. Você nunca poderia taxar a renda em 100%, mas se você está tributando o consumo em 100%, isso só faz a última coisa que você comprar duas vezes mais cara do que antes. Então, as pessoas, se elas estão pensando em gastar US$100.000 em um casamento, neste sistema isso iria custar-lhes $200.000. Sabemos que os ricos diminuem seus gastos quando as coisas ficam mais caras.
DSW: Ou se decidirem fazê-lo, isso é apenas uma propaganda melhor para a sua riqueza do que antes.
RF: Então, se eles querem pagar o imposto, eles são ainda mais capazes de demonstrar o quanto eles têm no banco. Nesse caso, diminuiríamos este ritmo de aumento nos preços de mansões e casamentos. Isso significaria que as pessoas logo abaixo dos ricos não sentiriam a mesma quantidade de pressão, e assim por diante em todo o caminho para baixo da linha. Seria aliviada a pressão que atualmente está fazendo famílias de classe média comprarem casas que são 50% maiores do que as que eles compraram em 1970. Por que eles estão comprando casas muito maiores? Porque outros como eles estão fazendo isso, porque as pessoas no topo da pirâmide estão gastando mais. Se você pudesse retardar o crescimento do consumo no topo, aplicar os dólares em investimentos, isso seria muito melhor para a economia. Você obteria alguma receita fiscal extra. Quem é mais feliz – o cara que dirige uma Ferrari em uma estrada esburacada, ou alguém que dirige um Porche 911 Turbo, que é a metade do preço, em estradas que parecem tapetes? Ninguém diria que o primeiro cara é mais feliz.
DSW: Então por que não ninguém escuta?
RF: [risos] Essa é a grande questão! Paul Samuelson gostava de dizer: “As pessoas me perguntam por que não sou rico, se eu sou tão inteligente?” – ao que ele respondia: “Eu sou rico!” Ele foi o autor de um livro best-seller, então ele realmente tinha um monte de dinheiro. Mas se essa ideia é tão boa, por que não adotamos isso? Acho que estamos mais perto de adotá-la agora, do que estávamos há 30 anos. Dois economistas conservadores publicaram um livro defendendo este imposto, em 2012, publicado pela American Enterprise Institute em Washington, um think tank (laboratório de ideias) proeminente de direita. Em algum momento teremos que fazer uma reforma tributária abrangente. Os baby boomers estão se aposentando, milhões mais a cada ano, e o orçamento vai ficar cada vez mais desqueilibrado. Em algum momento teremos que nos mover e considerar o que fazer. Este será um item maduro para discussão.
DSW: Existe uma maneira para que isso possa ser implementado localmente? Há outras nações que fazem algo assim? Por exemplo, Escandinávia?
RF: Os países europeus têm uma forma diferente de imposto sobre o consumo. Eles têm um imposto sobre o valor agregado, o que é questionável de cara, porque é regressivo. Os ricos consomem uma proporção muito menor de sua renda do que os pobres, dessa forma um imposto sobre o valor agregado é realmente uma taxa que os exclui das cobranças, em relação às pessoas mais abaixo na escala de renda. O que esses países fazem é compensar esse fato em suas despesas líquidas de segurança social. Eles têm um subsídio muito mais generoso para crianças, muito melhores subsídios para a educação, sistemas de cuidados de saúde universais, transporte público muito melhor, uma melhor manutenção da esfera pública em geral. Assim, o sistema geral é progressivo. Poderíamos ir por esse caminho também, mas eu acho que seria mais fácil de construir essa progressividade através do próprio imposto.
DSW: Então, isso é uma espécie de dependência do caminho, com base em onde estamos agora.
RF: Nós temos, na verdade, um imposto progressivo sobre o consumo em vigor para 95% dos americanos, agora enquanto falamos. A maioria das pessoas no país ainda não atingiu o limite de poupança dedutível em imposto, em suas 401.000 contas de poupança ou equivalentes. Então, nós estamos sob um sistema como esse agora, mas a razão pela qual ele não traz os benefícios que descrevi, é porque os ricos não estão sob um sistema como esse, porque já no curso normal das coisas eles economizam muito mais do que os limites dedutíveis nessas contas. Precisamos trazer os ricos para este sistema. Precisamos que a fração superior de imposto marginal sobre o consumo seja alta o suficiente para obter atenção deles. Então nós poderíamos começar a aplicar os recursos atualmente gastos em consumo pelos ricos em outras atividades que geram mais valor.
DSW: Vamos eliminar a desconexão entre o que sabemos teoricamente e também empiricamente, e a narrativa ou ideologia, que continua apesar disso. Para ilustrar, acabei de mostrar para você um ensaio que escrevi sobre um estudo a respeito da sobrevivência de empresas que abriram o capital na (bolsa de valores) New York Stock Exchange. Com base nas informações que eles tornaram públicas, você é capaz de codificar as políticas de funcionários das empresas. O estudo mostrou que cinco anos após a abertura de capital, as empresas que deram uma boa proposta para os seus empregados, tais como participação nos lucros e nos recursos humanos, sobreviveram absolutamente melhor do que as empresas que trataram seus empregados como dispensáveis. Com base nisso, você poderia pensar que se temos uma Economia de Darwin, e que as práticas de empresas que sobrevivem acabam se espalhando, então tratar bem os funcionários é um comportamento que simplesmente se espalharia por seus próprios méritos. Mas não foi isso que aconteceu. Esse estudo e o livro a partir do qual o conheci, “A Equação Humana” [The Human Equation] de Jeffrey Pfeffer, forneceu toda a informação científica, toda a fundamentação teórica, para dizer-lhe que um bom negócio é aquele que promove a cooperação, o comportamento pró-social – muito parecido com o que acontece em qualquer outro bom grupo. Mas há uma narrativa no campo da economia que eu acho que foi fortemente abraçada, especialmente pelas escolas de negócios, que faz você ver o mundo de forma diferente…
RF: Correto.
DSW: Acaba não sendo uma questão de dados, não uma questão de teoria, mas uma questão de visão de mundo, a lente através da qual você vê o mundo. Isso é o que parece vir a ser. Por favor, reflita sobre isso da forma que julgar melhor.
RF: Você fez tocou em um ponto muito forte. Se é verdade, como Pfeffer afirma, que as empresas geridas dessa forma se sobressaem em relação a outras empresas, então parece ser apenas uma questão de tempo até que apenas empresas desse tipo sobrevivam; as empresas que administram desta forma mais esclarecida. Se de fato empresas como estas são mais rentáveis do que outras empresas. Havia um grupo aqui em Cornell que afirmava que sistemas gerenciados por trabalhadores eram a única maneira de alcançar uma economia vibrante. Eles estavam estudando empresas organizadas dessa forma na ex-Iugoslávia. Minha pergunta para eles era, se essas empresas eram tão boas – conforme a alegação de que os trabalhadores seriam 50% mais produtivos se eles tivessem algum poder sobre a organização: se isso é verdade, por que empresas como estas não se espalham como fogo por toda a paisagem? Esta é uma enorme margem de lucro. Produtividade cinquenta por cento maior, se 70% dos seus custos são os custos do trabalho, como ocorre nos EUA, essa é a empresa mais rentável que se possa imaginar, ano após ano. Assim, haveria uma tendência para empresas como estas devorarem outras empresas. Eles não têm uma boa resposta à minha pergunta de por que essas empresas não se espalharam. Talvez seja porque as empresas organizadas dessa maneira produzem o que os trabalhadores acham que seria bom que as pessoas tivessem, ao invés de produzir o que as pessoas realmente querem. Deve haver alguma razão pela qual as empresas não se espalharam. Uma desvantagem é que os gerentes que estavam reproduzindo o modelo de maximização da riqueza dos acionistas se proliferaram em escolas de negócios, tornaram-se um foco forte por muitos anos nas décadas após a II Guerra Mundial, e podemos estar vendo algumas das consequências disso.
Chainsaw Al Dunlop, que era um notório maximizador de lucro a curto prazo – vamos atacar a empresa, vamos atacar o plano de pensão, vamos revogar todos os contratos implícitos e fazer o preço das ações subir – veio e deu uma palestra aqui. Um dos meus colegas reconheceu que ele era um charlatão e imediatamente baixou o preço das ações da empresa que ele estava administrando no momento. O meu colega perdeu um monte de dinheiro em sua aposta, porque as ações da empresa continuaram subindo. Ele finalmente teve que abandonar a empreitada. As ações da empresa realmente afundaram, mas tarde demais para se beneficiá-lo. Essas coisas muitas veze levam um longo tempo para sacudir o mercado e há um monte de agitação. Quando você está tentando recrutar funcionários, a primeira coisa que um candidato vê é o salário. A coisa mais difícil que enfrento quando converso com os alunos é dizer-lhes que eles devem olhar para o pacote como um todo. Há uma teoria bem conhecida em economia chamada de compensação das diferenças salariais. Quanto pior o trabalho, mais eles devem pagar para levá-lo a fazê-lo. Se você recebe uma oferta que é surpreendentemente elevada, dada suas habilidades e experiência, você deve se perguntar o que é, exatamente, que eles querem que você faça.
DSW: Foi no seu artigo – “O que define o preço da moral superior” [What Price the Moral High Ground]?
RF: Exatamente. Eles provavelmente estão esperando que você faça algo que a maioria das pessoas não quer fazer. Você não está comprando um alto salário. Você está comprando um pacote de características do trabalho. Você quer ser feliz, você não quer ser rico. Dinheiro ajuda você a ser feliz, mas não é a única coisa que importa. É uma mensagem muito difícil para os alunos assumirem e colocarem em prática. A maioria deles vê o salário, eles vêem o que os outros estão ganhando como salário. Essa é a comparação mais fácil de fazer entre os empregos. Se há algo que as empresas podem fazer para aumentar o salário de curto prazo, essa pode ser uma estratégia vencedora.
DSW: Dois elementos relacionam-se diretamente à teoria da seleção multinível. Um é deles é a questão do curto prazo contra a longo prazo.
RF: Certo.
DSW: Se você está tentando maximizar os lucros de curto prazo, isso tipicamente irá contra qualquer coisa a longo prazo. Além disso algumas pessoas se beneficiam em detrimento de outras. Se a elite se beneficia de algo que não é bom para a empresa ou para a economia maior, se eles estão na direção, é isso que vai acontecer. Então, essas são algumas razões pelas quais uma ideologia ou uma narrativa particular pode se espalhar apesar de não beneficiar o bem comum.
RF: Sim, e uma vez que as pessoas que abraçam essa ideologia têm um monte de dinheiro agora, e uma vez que existem menos restrições do que nunca sobre como eles podem gastar esse dinheiro para influenciar decisões políticas, eu acho que é um ponto muito importante.
DSW: Se voltarmos à desconexão entre o que Adam Smith realmente disse e o que se pensa que ele disse, e o que outras figuras como Friedrich Hayek, que é um dos pilares da ideologia do mercado livre, disse na verdade ao invés do que é propagado, então qualquer estudioso vai apontar isso. O que está acontecendo no nível ideológico não é apoiado pelo estudo acadêmico dessas pessoas ou por suas teorias. No entanto, isso é o que impulsiona as decisões.
RF: É frustrante, mas isso é verdade, e há inúmeros exemplos. Toda a ideia de que a redução dos impostos sobre os ricos vai estimulá-los a trabalhar mais e obter um enorme impulso para o crescimento do PIB é totalmente sem suporte empírico nos dados. Não é nem teoricamente previsto pelo modelo econômico básico. Se você aumentar o imposto sobre alguém, isso faz com que seja mais barato tirar uma folga, de modo que você pode ser tentado a pensar que isso iria fazer a economia crescer mais lentamente, mas isso também significa que ele tem que trabalhar mais para atingir um determinado nível de renda, e esses dois efeitos vão em direções exatamente opostas, e qual domina não é previsto pela teoria. Se você olhar no longo período da história, o que é claramente verdade é que hoje, com nossos salários muito mais altos em comparação com um século atrás, trabalhamos muito menos horas do que as pessoas há cem anos, assim que a teoria combinada com a evidência parece dizer que impostos mais altos sobre os ricos fariam a economia crescer muito mais rapidamente. Estas ficções persistem. As narrativas são firmemente apoiadas por pessoas com um interesse nelas.
O importante é não desanimar. Contra-narrativas podem fincar seus pés sob as circunstâncias corretas. Houve já uma narrativa muito forte, de que era inaceitável permitir a pessoas do mesmo sexo casarem-se. Todos os tipos de coisas terríveis aconteceriam se isso fosse permitido. Não havia um estado nos Estados Unidos que não tivesse grandes grupos firmemente opostos a permitir isso quinze anos atrás. Agora, praticamente todas as regiões do país têm uma maioria dizendo “por que não deveríamos permitir que as pessoas se casem com quem quiserem?” Essa mudança aconteceu mais rápido do que ninguém previu ou mesmo poderia ter imaginado, pelos argumentos que circulavam e as pessoas que os utilizavam. Não temos certeza em o que acreditar, nenhum de nós. Não temos tempo para investigar todas as perguntas. Inevitavelmente, dependemos das sugestões de outras pessoas. Em o que eles acham razoável acreditar? Se todos eles pensam que a escravidão é um mal horrível, então eu vou aceitar sem exame crítico. Um estudante de hoje não poderia dar um argumento sofisticado para explicar por que a escravidão é errada, porque todo mundo acredita que é errado. Mas em algum momento, havia discussões sobre isso e as pessoas aprenderam enfrentando isso. Uma vez que os argumentos começaram a mudar, então isso tornou-se uma conclusão superada. Então, insistir é importante. Estamos habituados a ver uma grande resistência à ideia de tributar a poluição. Quando um economista disse pela primeira vez que deveríamos obrigar as empresas a comprar licenças para descarregar enxofre no ar, foi um escândalo. Isso permitiria que as empresas ricas poluíssem proporcionalmente ao seu tamanho, os ambientalistas diziam. Mas, finalmente fizemos isso, e 25 anos mais tarde, num piscar de olhos, os níveis de enxofre diminuiram para valores toleráveis. Os custos de tornar o ar limpo eram uma fração do que havia sido estimado inicialmente. Temos que perseverar.
O fator mais importante na falha em abraçar uma visão de Darwin é a lição que é martelada em nós desde a infância, de que você não deve invejar o seu vizinho. Na verdade, não é realmente sobre a inveja – eu vou dizer-lhe sobre uma conversa que formou o meu pensamento sobre esse ponto. Eu ia falar sobre um livro anterior, Febre de Luxo [Luxury Fever], que também descreveu este fenômeno de despesa em cascata, na Universidade de Chicago. Na noite antes da minha palestra eu estava jantando com Dick Thaler (o economista comportamental), Cass Sunstein (co-autor de seu livro Nudge), e Richard Posner, uma figura muito distinta em direito e economia. Posner foi o último a chegar. Sunstein, Thaler e eu estávamos esperando na frente do restaurante. Posner dirige-se ao volante de um novo sedan Lexus, que era o carro de luxo daquele ano. Ele dá as chaves para o manobrista. Nós estávamos caminhando para a nossa mesa. Ele diz-me espontaneamente (eu não tinha mencionado o carro dele em nenhum momento): “Eu não sei nem me importo com o tipo de carro que meus vizinhos ou colegas dirigem”. Ele queria que eu soubesse disso. Ele sabe sobre o que eu vou estar falando no dia seguinte. Ele não quer que eu pense que ele é o tipo de pessoa que quer aparecer através da compra de um carro de luxo ou que ele está preocupado que seu carro não era tão bom quanto o carro de seu vizinho. Eu conhecia Posner há um bom tempo, e o que ele disse era completamente verdadeiro. Ele absolutamente não tinha ideia de que tipo de carro as pessoas dirigiam. Então eu disse: “Como é que você comprou o Lexus, Dick, e não o modelo Toyota equivalente do mesmo tamanho e fabricante? É tão confiável e útil quanto o Lexus.” “Oh, foi a qualidade, a qualidade palpável do Lexus. Foi o couro macio nos assentos. Foi o som maravilhoso que as portas faziam ao fechá-las. Você pode ouvir a qualidade.” Ele adorava que havia letras vermelhas de avisos no manual do proprietário, dizendo que você não deve tentar iniciar o seu Lexus quando o motor já está em execução. O motor é tão silencioso e sem vibrações, que esse é um risco real para o proprietário Lexus. Por isso, foi a qualidade. Perguntei: “O que você estava dirigindo antes?” Um carro qualquer de cinco anos. “E se nós enviássemos esse carro ‘velho’ de volta para 1930, em uma cápsula do tempo. Como as pessoas reagiriam ao vê-lo?”
Ele era esperto. Soube imediatamente que a resposta correta era de que as pessoas iriam ser surpreendidas pelo carro. Ficariam surpresas com o quão rápido ele era, quão bem ele fazia as curvas, os materiais e tudo isso. Então eu disse: “Suponha que nós queremos elaborar um modelo econômico formal do que levou você a comprar o Lexus. Precisamos de uma medida da qualidade, de modo que incluiria as distâncias de frenagem. Se o Lexus pára mais rapidamente do que outros carros, ganharia mais pontos por isso. Se levasse mais tempo para pará-lo, receberia pontos negativos. Teríamos que fazer os testes de aceleração, o teste skid pad, faríamos todos os testes. Os econometristas estimariam os pesos de cada uma dessas coisas. Então, nós criaríamos um índice de qualidade e, à medida que esse valor fosse maior, você estaria mais disposto a pagar mais pelo seu carro. Sim, todos concordaram que era o caminho certo para abordar escolhas baseadas em qualidade. Então eu disse – e esta foi a piada da conversa – “esse é exatamente o mesmo modelo que usaríamos para explicar o seu comportamento de compra se o seu objetivo fosse fazer seus vizinhos e colegas se sentirem mal, por você ter um carro melhor do que os deles.” Exatamente o mesmo modelo. Posner não pareceu de todo incomodado por isso. Thaler não pareceu muito interessado. Mas os olhos de Sunstein se arregalaram e ele disse: “Isso significa que esses efeitos estão em toda parte! É apenas uma externalidade de contexto. Não é ciúme ou inveja, mas a forma como você precisa de uma referência para fazer qualquer julgamento sobre a qualidade de qualquer produto ou serviço.” Então, ele quis escrever um artigo sobre isso imediatamente e ficou todo animado. Essa mudança sutil na maneira de enquadrar o fenômeno transformou Sunstein, que não sabe nem quer saber o quanto qualquer outra pessoa gastou em qualquer coisa – estou quase certo que ele não seria sensível a isso de qualquer maneira consciente – isso transformou ele de alguém que pensava que estes efeitos eram tangenciais e sem importância em alguém que os percebe como centrais. E eles são centrais.
DSW: Vocês escreveram artigos sobre isso?
RF: Escrevemos. Nós escrevemos um artigo de revisão de cem páginas sobre a forma como as preocupações posicionais refletem os salários no mercado de trabalho. Então eu acho que com o tempo – cem anos, para retornar ao nosso cenário inicial – as pessoas vão compreender que a percepção de Darwin era a central, que nos ajuda a compreender realmente um ampla faixa do comportamento econômico.
DSW: Mas esses cem anos realmente me incomodam. Eu quero que sejam dez anos. O que podemos fazer para isso acontecer em dez anos? Eu tenho feito lido o suficiente para saber que se voltarmos cinquenta anos, vamos encontrar algo muito parecido com o que temos hoje. As pessoas estavam criticando ferozmente a teoria econômica ortodoxa, pela melhor das razões, falando sobre a pressão tirânica que ela tem sobre a profissão econômica, como as coisas mudaram e como eles estavam esperando que mudasse mais rapidamente – tudo isso escrito em 1970. Basicamente, cinquenta anos já passaram sem muita mudança. O que há para dizer que isso vai acontecer em cem anos, ou, uma vez que existem coisas como pontos de ruptura, por que não dez anos?
RF: Bem, eu tenho um livro que sai em Janeiro em que eu estou fazendo mais uma tentativa de trazer essa conversa à tona. Eu estou versado o suficiente para saber que não será surpreendente se não acontecer muita coisa com a publicação do livro. Mas dado o meu conjunto de habilidades, eu não consigo pensar em o que mais eu sou capaz de fazer. Meu primeiro livro sobre estes temas – Escolhendo a poça certa [Choosing the Right Pond] – saiu em 1985, em Janeiro ou Fevereiro. Eu pensei que eu tinha topado com alguns insights muito importantes sobre por que os mercados não nos dão o que realmente queremos, e talvez até Setembro ou Outubro haveria projetos de lei tramitando na Câmara e no Senado para implementar todas as prescrições políticas brilhantes que se seguiram a partir desses insights. Bem, [risos] uma coisa que eu aprendi nas décadas seguintes é que não é provável que aconteça em resposta a qualquer um que chute da bola, mas o que você pode fazer, além de chutar a bola o melhor que você consegue?
DSW: Um apontamento a fazer é que o paradigma alternativo, que é um paradigma evolucionário, tem se desenvolvido tão rapidamente ao longo das últimas décadas, que se você voltasse apenas trinta anos – ao seu livro em 1988, Paixões dentro da razão [Passions within Reason] – era pioneiro nesse tipo de pensamento. Agora, se você olhar para o que aconteceu para a aplicação da teoria evolutiva aos assuntos humanos, é como noite e dia, a diferença entre trinta anos atrás e agora. Então, nós realmente temos um paradigma alternativo robusto. Eu gostaria de pensar que é uma virada de jogo. Armado com isso, poderíamos ter esse ponto de inflexão em dez anos. Não temos que esperar cem anos.
RF: Eu espero que você esteja certo sobre isso. O que é diferente sobre o mundo agora – esses livros saíram em meados dos anos oitenta – é que a mídia social não existia naquela época. Se uma boa ideia pode ser expressa simplesmente o suficiente, há muito mais oportunidades para se tornar viral agora do que no passado não tão distante. Alguém me pediu, em um grupo de emails de que participo, para descrever minha ideia mais importante em menos de um parágrafo. Uma frase ou duas, no máximo. Que ótimo exercício! Eu realmente nunca tinha pensado nisso. Eu finalmente consegui resumir para dizer: O que acontece quando você tem menos dinheiro para gastar é muito diferente do que acontece quando todo mundo tem menos dinheiro para gastar. Quando as pessoas pensam sobre pagar mais impostos para financiar a infra-estrutura em ruínas, pensando: “Oh, eu vou ter menos dinheiro. Eu não serei capaz de comprar o que eu quero.” Eles pensam que porque na maioria das vezes que eles tiveram menos dinheiro foi por causa de um divórcio ou um incêndio em casa, ou uma perda de emprego – algo que reduz a sua renda, mas não mudou a de todo mundo. Se você pagar mais em impostos, no entanto, significa que todos têm menos dinheiro para gastar. Então você ainda é capaz de obter o que deseja, porque as coisas que você quer – os extras – você tem que fazer uma oferta, apostar por eles. Especialmente se você estiver na metade superior da distribuição de renda, você estará oferecendo por essas coisas escassas que são agradáveis de ter, mas que não são essenciais. Eles vão para os mais altos apostadores e se todos nós temos menos dinheiro, então as coisas vão para as mesmas pessoas de antes. Por isso, não deveríamos ser tão relutantes em reconstruir nossa infra-estrutura pública, porque o pagamento de impostos não é tão caro e doloroso como pensamos que vai ser.
DSW: Eu comecei a pensar que o melhor resumo de uma frase para levar as pessoas a pensar da maneira certa é “A sociedade é um organismo”. Isto é, claro, uma antiga metáfora que vem desde à antiguidade. Mas há duas coisas sobre ela que são novos. Em primeiro lugar, existe uma base científica para ela que não existia antes. Em segundo lugar, é muito diferente do paradigma reconhecido atualmente, que é tão individualista. O que você acha disso? A sociedade é um organismo. O que um organismo faz em termos de captação de recursos, processá-los, fazendo as coisas certas com eles – a sociedade tem de ser assim também, pequena ou grande. Quando você começa a pensar na sofisticação e nas dezenas e centenas de mecanismos reguladores que são necessários para um organismo funcionar, e que a sociedade precisa de algo assim também. Dessa forma a ideia de que você pode ter nenhuma regulamentação torna-se um absurdo.
RF: Correto.
DSW: Então, o que você acha da ideia de “a sociedade é um organismo” como um gancho para levar as pessoas a pensar da maneira certa?
RF: Eu gosto dessa ideia. Eu acho que sua frase de abertura é: A sociedade é um Organismo. Então você tem cem palavras e eu acho que você pode fazer exatamente a inferência que você acabou de fazer. Isso é um resumo muito bom, rápido e direto, de como pensar sobre as coisas. Eu gosto disso.
DSW: Eu tenho a sua aprovação?
RF: Se jogue nessa.
DSW: Isso é ótimo! Eu acho que acabamos.
RF: Por hoje.
09 de Outubro de 2015
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